Palmeiras

Palmeirense escreve livro de como é ser torcedor visitante

Para quem ama estádios de futebol, chegam a soar como cruéis os relatos do autor Rodrigo Barneschi em “Forasteiro: Crônicas, vivências e reflexões de um torcedor visitante” (Editora Grande Área, 266 páginas). Com um texto cheio de sutilezas e detalhes que quem já esteve em um jogo de futebol consegue reconhecer, a obra traz relatos de uma vida que, parcialmente, não pode existir no momento. E, para além disso, de experiências que o futebol contemporâneo —que de moderno, no bom sentido, muitas vezes tem pouco— matou e mata a cada jogo sem torcida visitante em estádios pelo mundo.

Dono de um cartel de mais de mil jogos, o autor descreve visitas a estádios de diversas partes do Brasil e da América do Sul. Mas o jogo, em si, é só parte do processo. Viajar para outro bairro, cidade, estado ou país é construir tradições que podem durar uma reles visita ou um rosário delas, que engrandecem e emolduram a experiência futebolística. E embora sejam o centro de cada incursão em território inimigo, as partidas em si são na maioria das vezes só uma das atrações.

 

 

Adepto da ideia de que o estádio precisa ser um local “seguro”, fui sendo convencido, capítulo após capítulo, de que o futebol sem torcida adversária é mesmo uma aberração. De que não faz sentido enfrentar seu maior rival sem que os torcedores dele lá estejam para presenciar uma dolorida derrota ou festejar uma memorável vitória.

 

 

Porque tão emocionante quanto gritar o gol de frente para um numeroso contingente de cores adversárias, só mesmo sentir aquele som que vem num crescendo, atravessando o gramado para explodir no peito, quando o outro lado comemora uma bola na rede.

 

 

Esse é o segredo que muita gente não conta, mas que Barneschi revela: o gol do time adversário muitas vezes arranca lágrimas dos torcedores, mas elas nem sempre são apenas de tristeza. E ser privado disso por incompetência de autoridades e desejo de dirigentes é algo que as gerações futuras vão carregar como algo de que sentirão falta sem nem mesmo saber.

 

 

Engana-se quem imagina que o processo de Barneschi traga argumentos lógicos, justificáveis e sobreviventes à luz da razão. Ou que ele sequer queira convencer o leitor de que tem alguma razão. O autor sabe e descreve os perigos de ser visitante em um jogo de futebol. Não esconde nem romantiza a violência. Mas da maneira como ele entende o jogo, perrengues, hostilidades, confrontos com policiais e ou torcidas são partes inerentes e inegociáveis do futebol, algo que ele enxerga como um ritual sacro.

 

 

E a descrição das experiências que ele teve fazem com que seja muito possível compreender a beleza que ele vê no futebol do modo que o viveu, vive e gostaria de seguir vivendo, ainda que o leitor não tenha qualquer interesse em experimentar algo assim.

 

 

Palmeirenses certamente se identificarão mais com a obra, dado que Barneschi, além de palestrino, também fez parte de caravanas e foi a muitos jogos com a torcida uniformizada Mancha (Alvi-)Verde. Mas basta conhecer ou querer conhecer o sentimento de torcer para se encontrar nas páginas.

 

 

Os capítulos finais, no entanto, com a conquista alviverde do Brasileiro de 2018, em São Januário, as partidas com o Boca Juniors no mesmo ano, a briga com os carboneros do Peñarol (URU), em 2017, e a asséptica mas anti-sanitária final da Copa Libertadores de 2020 são um deleite de literalmente arrepiar quem viveu esses momentos, ainda que diante da luz azul da TV.

 

 

 

“Forasteiros” é a descrição de um futebol levado à sua potência máxima, para o bem e para mal. Um estilo de vida que sobrevive no submundo, à margem das arenas de mármore e jogos com assentos demarcados. E que pode até não soar para muitos como uma experiência agradável de se viver. Mas que Barneschi transforma em histórias e relatos deliciosos de se conhecer

 

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